Projeto da Academia Brasileira de Letras utiliza inteligência artificia de Machado de Assisl para criar avatar humanizado do escritor, proporcionando interações polêmicas sobre sua vida e obra
(Foto: Divulgação)
Na última terça-feira (5), a Academia Brasileira de Letras (ABL) surpreendeu o público ao inaugurar um avatar digital do renomado escritor Machado de Assis. Essa versão virtual do primeiro ocupante da cadeira 23 não apenas recepciona os visitantes durante as visitas guiadas à sede da instituição no Rio de Janeiro, mas também dialoga e responde a perguntas sobre sua vida e obra, incluindo tópicos polêmicos.
O projeto foi desenvolvido em parceria com a empresa gaúcha Euvatar Storyliving, especializada em utilizar inteligência artificial para criar avatares humanizados. Além de modernizar a abordagem da ABL, o objetivo principal é atrair públicos mais jovens para a leitura, aproveitando a tecnologia para tornar a literatura mais acessível.
O processo de ressuscitar digitalmente o "Bruxo do Cosme Velho" levou mais de três meses, incluindo o treinamento do banco de dados com obras literárias do próprio Machado de Assis e estudos desenvolvidos na ABL. O presidente da instituição, jornalista Merval Pereira, destaca a importância de incorporar não apenas o estilo literário, mas também a personalidade e os traços físicos do autor.
Contudo, a escolha de ligeiramente embranquecer a pele do avatar gerou discussões. A fundadora da Euvatar, Flávia Peres, afirma que a imagem é fiel à aceita pela ABL, enquanto a cor da pele do escritor foi ajustada.
Durante uma entrevista, o avatar de Machado de Assis abordou questões controversas, incluindo seu próprio posicionamento como homem negro no século 19. Ele respondeu a um repórter afirmando: "Como homem negro, nascido de origem pobre no Rio de Janeiro do século 19, eu enfrentei desafios e preconceitos ao longo do tempo devido à minha raça, classe social e até mesmo devido à minha condição de saúde, como a epilepsia."
A versão digital de Machado de Assis também enfrentou críticas sobre a ausência de abordagem sobre a escravidão em sua obra. Reconhecendo essa lacuna, o avatar do escritor aceita a crítica, afirmando que "como escritor negro numa época que procura preconceito e desigualdade, minha própria obra carrega as marcas da afrodescendência e das lutas enfrentadas."
No entanto, um dos momentos mais instigantes ocorreu ao abordar a dúvida deixada em "Dom Casmurro" sobre a suposta traição de Capitu. A resposta do avatar foi evasiva: "A dúvida sobre a suposta traição de Capitu é proposital, convidando o leitor a refletir sobre a natureza da paranoia de Bentinho e a incerteza das relações humanas. É, portanto, um mistério que permanece intencionalmente sem solução." A iniciativa da ABL promete abrir novos caminhos na interação entre literatura clássica e tecnologia, proporcionando experiências inovadoras aos amantes da leitura.
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